A terminologia empregada na física médica é, por vezes, fonte de confusão, especialmente no que se refere aos conceitos de radiação e irradiação. Embora intimamente relacionados, esses termos possuem definições distintas e aplicações específicas dentro dos contextos clínico, industrial e científico.
A radiação pode ser definida como a propagação de energia por meio de ondas eletromagnéticas ou partículas subatômicas. Do ponto de vista físico, trata-se de uma manifestação de energia que se propaga no espaço ou através de um meio material. Essa radiação pode ser classificada, de forma geral, em dois tipos: ionizante e não ionizante.
A radiação ionizante possui energia suficiente para ionizar átomos, isto é, remover elétrons de seus orbitais. Exemplos típicos incluem a radiação alfa (α), beta (β), partículas pesadas, raios X e radiação gama (γ). Por outro lado, a radiação não ionizante não promove ionização direta, mas pode causar excitação molecular. Nesse grupo estão a luz visível, o infravermelho, as micro-ondas e as ondas de rádio.
No âmbito da física médica, o interesse principal recai sobre a radiação ionizante, uma vez que ela é amplamente empregada em técnicas diagnósticas, como a radiografia, tomografia computadorizada e medicina nuclear, bem como em procedimentos terapêuticos, como a radioterapia externa e a braquiterapia.
Já o termo irradiação refere-se ao ato de expor um material, organismo ou sistema físico à ação de uma fonte emissora de radiação. Trata-se de um processo deliberado de interação da radiação com a matéria. A irradiação pode ocorrer com diferentes finalidades. No contexto clínico, por exemplo, é utilizada em tratamentos oncológicos por meio da radioterapia, que emprega feixes fotônicos (raios X ou gama) ou partículas (como elétrons, prótons e íons pesados) para o combate de neoplasias malignas. No setor industrial e hospitalar, a irradiação é empregada na esterilização de materiais médico-hospitalares, utilizando-se principalmente radiação gama. Também é aplicada na conservação de alimentos, contribuindo para a eliminação de microrganismos patogênicos e para o aumento da vida útil dos produtos.
É fundamental destacar que a irradiação, em condições normais de uso, não torna o material exposto radioativo. A exceção ocorre em situações específicas de exposição à radiação de nêutrons com captura nuclear significativa — um fenômeno raro nas aplicações médicas convencionais.
Portanto, embora a radiação seja o fenômeno físico subjacente, a irradiação diz respeito ao processo de exposição a essa radiação. Conceitualmente, um termo não substitui o outro, embora ambos estejam ligados no contexto aplicado. A radiação representa a propagação de energia por ondas eletromagnéticas ou partículas, enquanto a irradiação corresponde ao ato de submeter algo à ação dessa radiação.
Um exemplo prático pode ser observado na radioterapia externa (teleterapia), onde um acelerador linear gera radiação ionizante, na forma de raios X de alta energia. Ao direcionar esse feixe para a região tumoral, o paciente está sendo irradiado, ou seja, exposto à ação da radiação de forma controlada e planejada, com o objetivo de promover um efeito biológico terapêutico — como a destruição seletiva das células tumorais.
Diferenciar os conceitos de radiação e irradiação é essencial para o entendimento correto dos processos físicos e biológicos envolvidos nas práticas da física médica. O uso seguro e eficaz das tecnologias que envolvem radiação depende, entre outros fatores, de uma terminologia clara, precisa e alinhada às recomendações das principais entidades reguladoras da área, como a IAEA (International Atomic Energy Agency) e a ICRP (International Commission on Radiological Protection).
Texto por Letícia Fröhlich - Física Médica NUCLEORAD
Referências:
Hall, E. J., & Giaccia, A. J. (2019). Radiobiology for the Radiologist (8th ed.). Wolters Kluwer.
Khan, F. M., & Gibbons, J. P. (2014). Khan's The Physics of Radiation Therapy (5th ed.). Lippincott Williams & Wilkins.
IAEA. (2017). Radiation Protection and Safety of Radiation Sources: International Basic Safety Standards (GSR Part 3).